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“O Brasil me presenteou”, diz refugiada venezuelana que cursa Direito na UFPR

Por Camila Calaudiano 

Fotos: Giovani Pereira Sella

Supervisão: Maíra Gioia 

 

Dos aproximadamente 32 mil estudantes matriculados na UFPR, quase 100 são refugiados ou migrantes

 

Laura Valentina Ortega Hospedáles saiu da Venezuela com 17 anos, quando a fronteira do país estava fechada. Ela, o pai, a mãe e um irmão enfrentaram a ilegalidade em busca da chance de sonhar novamente.

 

“A gente enquanto estrangeiro ilegal tem o sonho de estudar, mas acha que não vai conseguir, porque quando a gente sai do país de origem não é pra estudar, é para trabalhar”, desabafa.

 

Graduanda de Direito na UFPR, venezuelana Laura Hospedáles. Foto: Giovani Pereira Sella

 

Em 2019, quando deixaram a Venezuela, o país passava por um dos ápices de sua crise política e social. Naquela época, a Organização das Nações Unidas (ONU) informou que, nos anos anteriores, cerca de 3 milhões de venezuelanos tinham deixado o país. Admiradora pelo “jeito brasileiro livre de ser”, ela também se apaixonou pela comida da região Norte, a primeira a ter contato ao entrar no Brasil, quando a ilegalidade já tinha ficado para trás. A família passou por Roraima e se instalou em Manaus, onde Laura retomou os estudos no último ano do Ensino Médio. Desde então, eles reconstroem suas vidas em um novo país, com uma nova língua e novas culturas. Agora com a chance de realizar o sonho, seu e dos pais, de estudar. Ela ainda fala sobre o processo de adaptação no Brasil.

 

“No primeiro momento eu não me sentia acolhida para nada. Sofri xenofobia e foi forte. O pessoal falava na minha frente que eu era burra […] eu terminei o Ensino Médio, mas foi como se eu não existisse lá. Tinha vezes que tinha que fazer grupo, mas o pessoal não queria fazer grupo comigo, porque claro, era a estrangeira que não sabia nada. Quando eu vim para cá (Curitiba) eu me senti mais acolhida”, conta.

 

Seu irmão, Lorwin Ortega, formado em Direito ainda na Venezuela, foi o primeiro da família a chegar em terras curitibanas. Suas chances de conseguir um emprego eram as mais promissoras, por ser o único da família a ter cursado o Ensino Superior.

 

“Não é uma coisa que você fala, ‘ah quero ir morar em outro país’, é a condição do país (de origem) que faz a gente tomar a decisão de sair. […] É muito difícil deixar a família, a vida, os amigos, os parentes, deixar tudo […] eu cheguei numa semana e na outra estava estudando já. Não sabia falar nada, não entendia nada. Realmente foi um processo muito, muito difícil”, conta.

 

Já em Curitiba, Laura trabalhava em uma fábrica, quando soube por um amigo que o vestibular geral da Universidade Federal do Paraná (UFPR) estava aberto. Naquele momento ainda desconhecia a modalidade de seleção para estrangeiros. Para quem viveu uma realidade no qual estudar era um luxo e a escolha óbvia seria trabalhar para sobreviver, ela ficou surpresa ao saber do Processo Seletivo Especial da UFPR, destinado a migrantes em condição de refugiados ou com visto humanitário.

 

“A universidade abriu uma porta que estava fechada pra mim, eu pensava que não poderia estudar […] já foi emocionante antes de entrar”, lembra.

 

Sua vontade era cursar medicina, mas foi inspirada pelo irmão a ir para a área jurídica. Aos 22 anos, está no primeiro ano da graduação e participa do projeto Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM), um convênio entre a ONU e a UFPR, realizado na Sala 28 do Prédio Histórico da UFPR, que visa ajudar estrangeiros com questões burocráticas. O refúgio no Brasil teve seus desafios, mas Laura não perdeu o brilho nos olhos e nem tirou o sorriso do rosto. Hoje ela se sente acolhida pelo projeto da Sala 28, fazendo o mesmo com seus conterrâneos. Ela garante que “voltar a sonhar é uma coisa que aconteceu aqui”.

 

“Acho que o Brasil me presenteou”, afirma.

 

Mas ela reconhece: ainda sente falta da sensação de pertencimento ao seu novo país e de ser vista como mais do que uma “estrangeira”. A futura advogada espera que, com o passar do tempo, essa estranheza diminua. Atualmente, conta com o apoio da família e com o benefício financeiro da UFPR, por meio dos auxílios da PROBEM, o programa da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis criado para apoiar os estudantes com fragilidade socioeconômica que precisam de auxílio financeiro para se manter no curso. Não pensa em deixar o Brasil, pretende seguir construindo sua vida e carreira aqui, em seu novo lar.

 

Semana do Migrante na UFPR

Celebrando a diversidade étnica, cultural e individual, e para evidenciar o “Dia Mundial do Refugiado” (20/06), bem como o “Dia do Imigrante” (25/06), o MOVE UFPR promove a “Semana do Migrante”, com o objetivo de reflexão sobre a importância da presença dos migrantes em nosso país. E a Agência Escola UFPR apresenta histórias daqueles que vieram para o Brasil a fim de recomeçar, ultrapassando as dificuldades enfrentadas em seu país de origem, e encontraram, na educação, todo o aconchego da Sala 28 da UFPR.

Acompanhe, nos próximos dias, mais relatos de refugiados ou migrantes em forma de perfil.

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Sobre a Agência Escola UFPR

A Agência Escola UFPR, a AE, é um projeto criado pelo Setor de Artes, Comunicação e Design (SACOD) para conectar ciência e sociedade. Desde 2018, possui uma equipe multidisciplinar de diversas áreas, cursos e programas que colocam em prática a divulgação científica. Para apresentar aos nossos públicos as pesquisas da UFPR, produzimos conteúdos em vários formatos, como matérias, reportagens, podcasts, audiovisuais, eventos e muito mais.

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