Por Alice Lima
Foto de destaque: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)
– “Descreva como você imagina a ciência e cientistas”.
– “Pessoas de jaleco branco em um laboratório, anotando fórmulas e segurando frascos com líquidos coloridos”.
– “Ou cientistas entre telescópios e foguetes que vão para o espaço”.
Essa cena, meramente ilustrativa, é um retrato de como a ciência costuma ser vista. De maneira distante, como outro universo, para poucos e feita por quem estaria em “outro patamar” do conhecimento. Mas essa imagem está em transformação e, um dia, os pesquisadores que se dedicam aos laboratórios de química ou a desvendar o espaço serão parte das representações, mas não a única. É o que propõe o Programa Nacional de Popularização da Ciência (POP Ciência), lançado esta semana pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).
A iniciativa representa um passo importante para que o Brasil desenvolva a cultura científica de uma maneira institucionalizada, mais estruturada, democrática e em rede, com tecnologia e inovação conectadas à inclusão e à diversidade. Assim, será mais natural despertar o interesse pela ciência e fornecer o apoio necessário para que seja uma realidade para todos, como explica a diretora de Ciência, Popularização e Educação Científica do MCTI, Juana Nunes.
“A gente tinha ações que ocorriam de forma muito verticalizada. O pessoal dos centros e museus em uma frente, das olimpíadas científicas em outra. Então, o POP Ciência constitui uma rede, um ecossistema de popularização da ciência, que quer unificar as ações existentes do MCTI sobre divulgação científica e democratização da ciência, otimizar recursos, além de ter mais capilaridade e melhor desempenho, atuando com estados, municípios, universidades, institutos federais”, explica Juana.
Para isso, diversas práticas devem ser fortalecidas e novas políticas construídas, que atendam aos eixos do Programa. Entre as novidades, está a criação da Virada da Ciência, que será mais voltada aos trabalhadores e pessoas fora do ambiente escolar, e aposta na inclusão e na diversidade.
Para chegar a essa proposta e todos os direcionamentos do POP Ciência, foi estabelecido formalmente o Comitê de Popularização da Ciência e Tecnologia. “Um comitê que, de fato, tem a representação da sociedade e diversos atores que se unem pela popularização da ciência”, destacou a diretora. A missão desse grupo é atuar na proposição de ações e estratégias, fazer a articulação política e mobilizar diferentes setores do governo e da sociedade civil para alcançá-las.
O pró-reitor de Extensão e Cultura da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Rodrigo Reis, explica que a iniciativa consolida uma política, que vinha atuando no Brasil desde 2004 na área de popularização e divulgação da ciência.
“O decreto dá força tanto para o MCTI quanto para os demais órgãos do governo para o desenvolvimento e fortalecimento de ações relacionadas ao tema. O POP Ciência diz, por exemplo, que o fomento dessas ações vai se dar por meio de editais específicos para a área e seus diferentes eixos”, ressalta Rodrigo.
Ele destaca que um dos eixos presentes é o de formação de pessoas para a área de divulgação e popularização da ciência. “Isso pode e deve estimular a criação e organização de programas de pós-graduação com esse foco. Hoje há muito poucos no Brasil, mas é uma área importante e surge como demanda”.
A coordenadora geral da Agência Escola UFPR, pesquisadora de divulgação científica, Regiane Ribeiro, também participou da elaboração do POP Ciência e acrescenta mais pontos positivos desse plano.
“Além de englobar todas as iniciativas que já acontecem nessa área há muitos anos, e que já são consolidadas, como a Semana Nacional da Ciência e Tecnologia, por exemplo, abre espaço para se pensar novos eixos, entre eles a diversidade da ciência não só nas questões identitárias, mas também na abertura de espaço institucionalizado para saberes tradicionais e suas tecnologias. Vale ainda reforçar a oportunidade de relacionarmos ciência e arte promovendo uma interação entre artistas, educadores populares e cientistas no fortalecimento de uma cultura científica”, reforça.
Ciência em rede
A ciência é coletiva e essa visão deve ser ampliada com o estabelecimento de “redes de ciência” previsto no POP Ciência. O Paraná tem a primeira rede estadual na área: a Paraná Faz Ciência, que conta com o apoio da Fundação Araucária e também do MCTI. “Espero que possa servir como modelo para os demais estados para a organização das redes. A ideia é que as redes possam organizar as diferentes iniciativas, como museus e feiras de ciência, por exemplo, a partir da perspectiva do território ou da região onde estão inseridas”, explica Rodrigo Reis, que também é articulador do Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação (Napi) Paraná Faz Ciência.
A rede paranaense foi criada para reunir profissionais e estudantes que trabalham com divulgação científica e, assim, conhecer melhor as ações e espaços com esse foco para ampliar trocas e parcerias. A assessora da Fundação Araucária e articuladora do Napi Débora Santana acredita que o Programa traz a possibilidade de expansão das ações que já são executadas.
“Considero que o Paraná, atualmente, está entre os estados mais organizados na divulgação científica e com maior potencial de crescimento nessa área. A rede tem contribuído nesta organização e divulgação e, com os novos apoios e financiamentos, contribuirá ainda mais. A Fundação Araucária tem investido muito em divulgação científica, como nunca foi visto na história local e certamente da maioria dos estados do Brasil. Seu papel tem sido fundamental para os avanços que temos acompanhado”, opina Débora.
Regiane, que também é integrante do Paraná faz Ciência, complementa a importância do eixo de comunicação pública da ciência, que propõe pensar como fortalecer a ciência a partir dos meios de comunicação, como o trabalho desenvolvido pela Agência Escola UFPR.
“O projeto da AE dialoga nessa perspectiva tanto na produção de conteúdos, combate à desinformação a partir de informações confiáveis, com evidências científicas, quanto na questão da formação dos estudantes para que as pessoas entendam como a ciência funciona, para que se aproximem delas no cotidiano”, explica.
Desafios
Alguns desafios para o comitê e divulgadores da ciência são:
- Combater a desinformação;
- Aumentar a consciência sobre as mudanças climáticas;
- Ampliar a diversidade na ciência;
- Fortalecer as ações que tenham como pauta o enfrentamento das desigualdade sociais.
Para essas conquistas, a diretora de Ciência, Popularização e Educação Científica do MCTI explica que é necessário melhorar a qualidade do ensino na escola pública, ofertar educação científica de qualidade para as crianças e jovens e, além disso, atuar além do público escolar. As ações precisam atingir trabalhadores, pessoas da terceira idade, populações vulneráveis, reconhecer o conhecimento dos povos originários e quilombolas. Tudo isso em uma agenda interministerial.
“Democratizar o conhecimento é fazer chegar a nossa riqueza, o que fazemos e produzimos, para a sociedade e reconhecer que a sociedade também produz conhecimento”, explica Juana Nunes.
Confira o decreto
O anúncio do POP Ciência foi feito pela ministra Luciana Santos durante o lançamento do programa Saúde com Ciência, no dia 24 de outubro, uma iniciativa interministerial coordenada pelo Ministério da Saúde e a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.
Que tal ver descrição mais diversa, pop e democrática da ciência e dos cientistas? Assista ao vídeo e veja onde eles realmente estão!