Por Letícia Negrello
Edição: Alice Lima
Fotos: Letícia Negrello
“Nós precisamos fazer da política de inclusão de gênero um programa estruturante do nosso Ministério”. É o que afirma Luciana Santos, Ministra do Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), ao assinar o novo edital do programa Futuras Cientistas, em parceria com o Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (Cetene), que oferece 470 bolsas para alunas e professoras de escolas públicas.
O anúncio foi feito nesta quarta-feira (26), no estande do Cetene na ExpoT&C, durante a 75ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). O programa existe desde 2012 com foco em melhorar o acesso e permanência de meninas e mulheres nos espaços científicos das áreas de STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), e desta vez, terá abrangência nacional.
Segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em todo o mundo, as mulheres representam apenas 35% dos graduandos de ensino superior nessas áreas, e somente 1 a cada 3 pesquisadores é mulher.
Além disso, dados do CNPq revelam que 59% das bolsas de iniciação científica são de pesquisadoras, mas, as de produtividade – que são as mais prestigiadas e com financiamento maior –, a parcela feminina cai para 35,5%.
A luta por direitos das mulheres segue por décadas, e a Reunião Anual da SBPC, que acontece na UFPR entre os dias 23 e 29 de julho, tem sido um espaço de discussão, apresentações e reflexão sobre a necessidade de maior apoio à participação feminina na ciência.
Pela equidade de gênero
Com ações em todos os dez estados e Distrito Federal onde a Fundação Oswaldo Cruz está presente, o “Meninas e Mulheres na Ciência” é uma iniciativa criada em 2017 pensada na equidade de gênero. O programa surgiu na gestão da primeira presidenta da história da Fiocruz, Nísia Trindade Lima — importante pesquisadora brasileira e hoje ministra da Saúde do Brasil.
Cristina Araripe Ferreira, pesquisadora titular da Fundação Oswaldo Cruz da área de educação, ciências e tecnologia, coordena o programa Mulheres e Meninas na Ciência desde da sua criação. Ela conta que dois importantes eixos do programa são dar visibilidade à trajetória de mulheres pesquisadoras e também o incentivo a jovens para que sigam carreiras científicas.
“Se a gente falar também sobre a questão da raça, temos pouquíssimas pesquisas, de contar no dedo, de pesquisadoras titulares negras”, aponta Cristina. Ela cita que as causas para esse desequilíbrio são estruturantes, e o mundo inteiro teria necessidade de programas como esse.
“Hoje o grande desafio da universidade pública brasileira é a questão da permanência, né? Muitas vezes as mulheres não conseguem dar prosseguimento aos estudos”, ela complementa.
Mariana Souza, doutora em Biologia Celular e Molecular pela Fiocruz e também parte do programa, conta que a iniciativa surgiu de uma urgência da instituição em mudar o cenário de mulheres na ciência. Ela reforça que o objetivo não é doutrinar ou convencer ninguém a seguir carreira, mas um aprendizado. “Ciência vai muito além de laboratório, é pensamento crítico e reflexão”, afirma.
A Fiocruz possui uma série de jogos e materiais interativos sobre mulheres na ciência, que estão presentes no estande da instituição da SBPC Jovem e despertam a curiosidade de todos que passam por lá — nas meninas, e também nos meninos. As integrantes do projeto contam que sempre incentivam a participação de todos nesse processo fundamental de disseminação de conhecimento e busca por igualdade.
Localizado na SBPC Jovem, o estande Ciência Menina reúne diversos projetos, apresentações com foco na participação feminina na ciência. Ações interativas com foco principal nos visitantes de ensino básico, como o Meninas e Mulheres na Ciência, projeto de extensão da UFPR desde 2020, mas que já realiza ações com foco na divulgação e educação científica sobre mulheres na área acadêmica há mais de 10 anos.
“Mulheres são muito desencorajadas a estudar ciência, e as próprias mulheres que já estão no meio acadêmico passam por muita discriminação, então a gente tem esse objetivo de encorajar e empoderar as mulheres a não só seguirem a carreira, mas ocuparem os espaços de tomada de decisão e liderança do campo científico”, afirma Camila Silveira, professora do Mestrado Profissional em Química em Rede Nacional (PROFQUI) da UFPR e coordenadora do projeto.
Ela conta que, a partir de uma percepção de que o repertório geral das pessoas sobre mulheres cientistas é normalmente baixo, o projeto surge com o objetivo de divulgar a imagem — por meio de ilustrações digitais realistas — o nome e a importância de várias mulheres cientistas da história.
O uso de passatempos e jogos, como palavras cruzadas, caça-palavras, desenhos para colorir, quebra-cabeça, jogo da memória foi a maneira encontrada de “furar a bolha da universidade” e levar esse trabalho a escolas, feiras e museus. Os materiais são disponibilizados tanto de forma eletrônica quanto física, e sempre usados em ações do projeto realizadas em escolas, com alunos e professores.
Um futuro mais diverso
A 75ª Reunião Anual da SBPC está por todos os lados com imagens, frases de incentivo e uma programação com foco na causa feminina na ciência. Certamente reforça a mensagem: “Lugar de mulher é onde ela quiser — inclusive na ciência”.
“Ao ingressar na FioCruz, como jovem pesquisadora, pude conhecer muitas histórias”’, conta Cristina, ao lembrar de como as biografias de Bertha Lutz, sufragista e pesquisadora do Museu Nacional, e Maria von Paumgartten Deane, médica parasitóloga, a inspiraram. “Quando a gente abraça a carreira, quer ser pesquisadora, a gente não pode desistir. Meninas, não desistam. Vão em frente”, ela reforça.
Camila Silveira cita a importância de persistir e de ter uma rede de apoio. “Muitas vezes é difícil lidar com tudo isso sozinha, então se fortaleça em redes de mulheres. Assim, a gente consegue se apoiar, se acolher, se fortalecer.”