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“Eu tive bastante influência da minha mãe”, afirma cientista premiada da UFPR

Por Priscila Murr 

Fotos: arquivo pessoal

Supervisão: Maíra Gioia

 

Atuando como professora na UFPR Palotina há quase dez anos, a cientista premiada Mara Fernanda Parisoto garante que a educação é uma das profissões mais gratificantes e, ao mesmo tempo, a que mais pode melhorar o mundo

 

A distância de Curitiba a Palotina é de aproximadamente 700 quilômetros. Já o intervalo de tempo entre a Agência Escola UFPR e a professora Mara Fernanda Parisoto, física que atua no Departamento de Engenharias e Exatas do Setor Palotina da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é de apenas um clique! Mesmo com a tecnologia em favor da aproximação, um empecilho: a mídia utilizada para acesso à plataforma que oportunizaria a entrevista, não apresentava a opção ‘gravação’. E o sistema operacional do smartphone também não permitia o registro enquanto conectado estreitando o afastamento físico. Mas… já nos primeiros segundos on-line, Mara, que tem essa característica sobressalente, propõe: “‘posso ajudar’, eu gravo por aqui e depois envio o link”.

Professora da UFPR é vencedora do Prêmio Capes Futuras Cientistas 2024. Foto: acervo pessoal

Foi a ânsia por ‘ensinar’ que levou a docente a ser contemplada com o Prêmio Capes Futuras Cientistas 2024, que promove o incentivo à participação feminina nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM), destacando a produção de excelência em pesquisa científica no Brasil. E foi sempre assim, desde os primeiros anos no Ensino Básico, a tímida menina, natural de Chapecó (SC), amava ajudar os colegas a entender melhor as tarefas comuns ao dia a dia de um estudante. Atualmente, a cidade natal de Mara é considerada como o principal centro de desenvolvimento cultural, político e econômico do oeste do Estado, e também é conhecida como a capital brasileira da agroindústria.

Cerca de dez anos atrás, a quarta maior cidade do interior de Santa Catarina ainda abrigava, debaixo de seu céu fascinante, uma sonhadora.

 

“Eu tive bastante influência da minha mãe, ela era muito diferente do geral, gostava de mexer com consertos das coisas de casa: mudar resistência do chuveiro; usar ferramentas como furadeira; trocar pneu… são coisas que, normalmente, a gente não vê muitas mulheres fazendo – mas eu achava muito legal isso de entender o funcionamento das coisas. Eu morava no interior e, nossa, lá o céu é muito bonito, porque não tem luzes externas, eu gostava muito, ficava olhando o céu por muito tempo… e tudo isso foi me fascinando, despertando o desejo de saber como as coisas realmente funcionam. Na época do Ensino Médio, eu tive um professor que me influenciou muito, despertou ainda mais a minha curiosidade!”, diz.

 

A escolha pelo curso de Física não se deu apenas por gosto. A cientista conta que foram vários os fatores que a levaram a essa decisão.

 

“Eu tinha muito receio de fazer um curso e não conseguir me manter financeiramente. Naquela época, a gente tinha muita dificuldade financeira e eu precisava escolher uma profissão com a qual conseguisse me manter. No Ensino Médio, durante os três anos, eu só tive um ano com professores de física. Nos outros, quem dava a disciplina não era formado em física. Faltavam profissionais para essa disciplina. Por isso, pensei: ‘ah, então, tenho bastante probabilidade de não ficar desempregada’. Eu também tinha muito interesse pela biologia e, no vestibular, passei nos dois cursos. Acabei escolhendo a física, mas eu gostava dos dois igualmente. Inclusive, no mestrado e no doutorado, trabalhei com biofísica, juntando as duas áreas”, conta.

 

A partir desse percurso, o Currículo Lattes da professora foi sendo recheado de experiências…

‘Licenciada em Física pela Universidade Comunitária de Chapecó, Mestrado e Doutorado em Ensino de Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Atualmente professora Adjunta da Universidade Federal do Paraná – Campus Palotina, na qual atuo na graduação e no Mestrado Acadêmico em Ensino de Ciências. Atuo também no Mestrado Profissional em Ensino de Física em Medianeira. Trabalho na formação inicial e continuada de professores, divulgação científica e tecnológica, ensino não formal, redução de evasão e retenção nos cursos de Ciências Exatas e aumento da procura por esses cursos, especialmente por mulheres. Pesquiso e ministro cursos com foco em metodologias ativas, principalmente utilizando estudos da neurociência aplicada à educação’.
…essa é uma descrição literal, elaborada pela própria docente, padronizada exatamente como indica a plataforma nacional para o registro quanto à formação acadêmica e profissional de pesquisadores do Brasil. Mas a vida que a Mara dedica àquilo que escolheu, ah, isso não cabe nas páginas do serviço on-line do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

 

“Eu tive muita oportunidade, acho que a gente tem que lutar pra que as outras pessoas também tenham oportunidades. Um dos meus maiores objetivos, hoje, é aumentar as possibilidades, tanto para os alunos, para as crianças das escolas, aprenderem e terem contato com ciência, de uma forma diferente, o quanto antes, quanto aumentar a perspectiva de trabalho para os nossos egressos aqui do curso, das licenciaturas, para que esses estudantes tenham oportunidade de trabalhar com divulgação científica em outros espaços… se é pra sonhar, vamos sonhar grande: quero conseguir levar a ciência a mais lugares, como uma política pública, tendo, por exemplo, em todos os municípios, alguém concursado para fazer divulgação científica. Também desejo melhores condições para os professores, porque a educação é uma das profissões mais gratificantes e, ao mesmo tempo, é uma das que mais pode melhorar o mundo”, afirma.

 

Sua experiência em todos os níveis de ensino, e em ambientes e áreas diversas, efetiva, sem dúvidas, a prática profissional. Porém, o olhar sensivelmente aguçado de Mara para com as necessidades do outro, isso vem desde muito cedo, justamente quando ela começa a oferecer seu conhecimento e, como reflexo disso, vive em estado de alegria. E a felicidade não parou por ali. Até hoje, a já não tão tímida professora da UFPR se dispõe a ensinar com dedicação, sabendo que pode, sim, fazer toda diferença na vida de alguém.

 

“Geralmente, a gente faz entrevista com os estudantes aqui do curso de licenciatura em Ciências Exatas, perguntando o motivo pra eles escolherem a física, a química ou a matemática. Quase 100% têm alguma influência dos professores – e esse também foi o meu caso”, conta.

 

A professora Mara Fernanda Parisoto sempre foi apaixonada pelo céu. Foto: acervo pessoal

Mantendo íntima relação com a área da pesquisa propriamente dita, a chapecoense atua, inclusive, de forma a elaborar estudos teóricos relacionados à sua área. Durante a 8ª Conferência Internacional de Mulheres na Física, evento on-line que aconteceu em 2023, Mara participou, apresentando uma análise sobre a imagem da mulher associada a áreas científicas. Ao todo, 234 crianças, jovens e adultos de Iporã e Palotina foram ouvidos, apontando para o quadro de sub-representação feminina, sobretudo na área da física. O trabalho revela que meninas e meninos só têm consciência de que uma mulher pode fazer ciência a partir de seus 12 ou 13 anos de idade. Antes disso: páginas e páginas de livros cheios de histórias de cientistas homens.

Não se limitando à teoria, a professora sempre procura a relação com a prática. Desde 2023, uma pesquisa feita no âmbito do Futuras Cientistas, mapeia o conhecimento dos estudantes sobre ciência, universidade pública, personalidades científicas brasileiras, etc. A iniciativa seleciona meninas estudantes do 2º ano do Ensino Médio para uma imersão no ambiente científico universitário, e é uma parceria entre o Centro de Tecnologias Estratégicas do Nordeste (Cetene) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), órgão do Ministério da Educação. E o projeto efetiva uma mudança de percepção, mostrando, a cada menina, que ela pode, sim, fazer qualquer coisa a que se proponha.

 

“Depois de fazerem as formações e passarem por todas as atividades, muda muito a visão das estudantes do grupo. Então, acredito que o projeto mostra pra elas que elas são capazes, que é possível aprender e ensinar. Acho que o grande problema que leva as meninas a não fazerem algo é acreditarem que não conseguem, e, se elas virem outras meninas, principalmente da mesma idade, elas percebem que, se outras conseguiram, elas podem também!”, reflete.

 

A ciência precisa de variedade de pessoas

Segundo dados da Agência Bori (2024), o Brasil é o terceiro colocado na lista de países com maior participação feminina na ciência. O levantamento aponta que, nos últimos 20 anos, foi de 38% para 49% a proporção de pesquisadoras que assinam publicações no país. Além disso, houve um crescimento na participação de mulheres na produção científica, sobretudo nas áreas de STEM. Em 2020, eram 35%, já em 2022, 45%. No âmbito da UFPR, a presença feminina, de forma geral, é forte: desde 2018, elas representam cerca 75% das matrículas nos cursos de graduação. Mas, especificamente na área de exatas, há pesquisas que indicam que a presença de mulheres é muito menor.

“Na área da física, se não me engano, 38% são mulheres e o restante, homens. E essa porcentagem também varia muito depois. A gente vê um número bem menor da presença feminina no mestrado, doutorado, pós-doutorado e bolsas de produtividade. Assim que vai aumentando a formação, diminui a porcentagem de mulheres. Isso se chama ‘exclusão vertical’. Então, existe essa dificuldade de as mulheres continuarem os estudos, se aperfeiçoarem em suas áreas. E isso é um problema porque a ciência precisa de variedade de pessoas para poder conseguir resolver os problemas, porque cada pessoa tem uma história diferente, uma forma de pensar particular, e isso ajudam a resolver os problemas que vão aparecendo na ciência”, finaliza Mara.

Foto: acervo pessoal

Muito próxima de completar seus dez anos de atuação na UFPR, a docente, admiradora confessa de suas colegas de setor, exala a paixão pelo que faz… e, mesmo através de uma tela, intermediando os 50 minutos de interação virtual, é possível sentir! Mara é a primeira entrevistada de uma série que conta a história de três professoras do Setor Palotina da UFPR, em alusão ao Dia da Internacional das Mulheres, reconhecendo não só seus feitos concretos, como formação, prêmios ou estudos em andamento, mas enaltecendo a atuação, num constante esforço para uma educação de excelência, mais humana, inclusiva e sem preconceitos, numa área onde a presença feminina decresce, seja por falta de incentivo, dificuldades de inserção ou discriminação por gênero.

E, para dar um gostinho da próxima história, não precisa ir longe, a entrevista de Mara já revela: “Eu admiro muito a professora Rita de Cássia. Porque a história dela é muito difícil, ela tem sete irmãos, veio de uma família humilde, assim como eu, mas ele teve bastante dificuldade… ela é negra e eu mesma já presenciei situações de preconceito contra ela. E fiquei muito contente quando ela ganhou prêmios, porque foi uma forma de dizer, pra quem menosprezou ela: “TOME!”. Ela participa bastante dos projetos com que eu trabalho, conseguiu ir pra Harvard… Então, pra mim, ela é uma inspiração!”.

 

Mulheres na Ciência

O perfil da professora Rita de Cássia dos Anjos, que também atua no Setor Palotina da UFPR, no Departamento de Ciências Exatas, será publicado no próximo dia 11. Na sequência, em 13 de março, será a vez da história de Roberta Chiesa Bartelmebs estampar o site da AE. Ela é professora adjunta da UFPR no Setor Palotina e atua tanto na graduação quanto na pós-graduação.

A Agência Escola UFPR acredita que quando a gente vê mulheres sendo reconhecidas nessas áreas, outras veem que isso é possível também.

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Sobre a Agência Escola UFPR

A Agência Escola UFPR, a AE, é um projeto criado pelo Setor de Artes, Comunicação e Design (SACOD) para conectar ciência e sociedade. Desde 2018, possui uma equipe multidisciplinar de diversas áreas, cursos e programas que colocam em prática a divulgação científica. Para apresentar aos nossos públicos as pesquisas da UFPR, produzimos conteúdos em vários formatos, como matérias, reportagens, podcasts, audiovisuais, eventos e muito mais.

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