Artigo de Junior Garcia
Professor do Departamento de Economia da UFPR, coordenador do Grupo de Estudos em MacroEconomia Ecológica (GEMACEO), diretor da regional da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica (ECOECO) e bolsista produtividade em pesquisa do CNPq
A Economia de Baixo Carbono corresponde a um sistema econômico que busca reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) associadas à produção e ao consumo de bens e serviços, se possível, alcançando emissões zero ou neutras. Uma forma de reduzir as emissões é a partir do aumento da eficiência do sistema econômico (produção e consumo) em termos da dinâmica do carbono, a qual pode ser alcançada com a adoção de tecnologias e técnicas mais eficientes quanto ao uso dos recursos naturais e a geração de emissões e outros resíduos.
Outra ação é investir em sistemas de captura de carbono para compensar as emissões dos GEE, tais como a recuperação e conservação da cobertura florestal, embora o potencial seja relativamente pequeno frente ao volume das emissões totais (estimadas em mais de 37 bilhões de toneladas CO2 em 2021), e os resultados somente serão observados no médio e no longo prazo.
A principal contribuição da Economia de Baixo Carbono é a incorporação do fluxo de carbono na tomada de decisão da produção e do consumo de bens e serviços. Assim, os bens e serviços poderiam ser avaliados e qualificados em termos de sua intensidade no uso de recursos naturais e na emissão de GEE, ou a respeito da adoção de medidas pelas empresas para compensar suas emissões e o uso de recursos naturais. Outra mudança poderia ser a criação de um imposto associado a intensidade de carbono nos bens e serviços. Mas a mudança mais efetiva para promover uma Economia de Baixo Carbono é a redução absoluta do consumo de bens posicionais, se possível, a proibição da produção e o consumo desses bens e serviços, os quais são intensivos em emissões e no uso de recursos naturais.
A busca por uma Economia de Baixo Carbono (carbono zero ou neutro), também considerada na abordagem da Economia Verde, é realizada no contexto das estratégias adotadas para auxiliar na mitigação das mudanças climáticas. Os GEE, como Dióxido de Carbono (CO2), Metano (CH4) e Óxido Nitroso (N2O), são considerados como aqueles gases que afetam a relativa estabilidade climática global. Isso porque o aumento da concentração desses gases na atmosfera está associado ao aumento da temperatura.
Esse aumento na concentração desses gases na atmosfera, portanto, pode acarretar mudanças no padrão climático, conforme apresentado pelo IPCC (International Panel on Climate Change). Nesse contexto, a principal ação é justamente promover a redução das emissões de GEE e estabilizar a concentração desses gases na atmosfera.
Embora o Brasil esteja entre os 10 maiores emissores de GEE do mundo em 2020, conforme dados disponíveis na base de dados do Banco Mundial, as suas emissões representam 2,3% do global, enquanto China (28,1%), Estados Unidos (11,9%), Índia (6,9%), União Europeia (6,8%), Rússia (5,1%) e Japão (2,4%) responderam por 61% das emissões globais de GEE em 2020.
Desse modo, em termos de emissões de GEE o Brasil, de maneira individual, tem pouco a contribuir para a mitigação. Isso não significa que a sociedade brasileira não deva adotar medidas para a mitigação das emissões, mas que as ações devem ser conjuntas, com participação fundamental dos principais emissores globais.
A Floresta Amazônica tem um importante papel na dinâmica climática e no ciclo hidrológico regional e global, além da preservação da biodiversidade, mas não por sua capacidade de captura de carbono frente ao volume das emissões globais. A Floresta Amazônica abriga significativo estoque de carbono, estimado por Saatchi et al. (2007) em 86 bilhões de toneladas, portanto, o desmatamento e as queimadas contribuem para aumentar as emissões globais, além da perda da biodiversidade e de importante serviços ecossistêmicos, como seu papel no ciclo hidrológico regional e global. Embora a agropecuária brasileira seja colocada no debate internacional como um importante vetor de emissões, entretanto, sua contribuição é relativamente pequena frente à escala global.
As emissões agropecuárias foram estimadas em 477 milhões de toneladas de CO2e em 2020, conforme 6º Relatório de Estimativas Anuais de Emissões de Gases de Efeito Estufa no Brasil. Dessa maneira, a principal contribuição do Brasil em termos de mitigação é conter o desmatamento e a perda de biodiversidade na Amazônia e nos demais biomas.
Quanto ao papel da sociedade, enfrentamos um importante dilema, porque, por um lado, uma medida é a adoção de práticas de consumo consciente, ou seja, redução efetiva do consumo, a qual estaria somente a disposição para parcela da classe média, em especial a classe média alta; por outro, precisamos universalizar o acesso aos bens e serviços essenciais para parcela significativa da população.
Para essa universalização, a sociedade precisa apoiar medidas para a redução das desigualdades, mas isso também implicará inevitavelmente no aumento das emissões de GEE e uso de recursos naturais, justamente em razão do necessário e urgente aumento do consumo dos bens e serviços essenciais. Isso é justiça social.
De nada adianta adotar medidas de mitigação sem justiça social. Nesse sentido, para uma solução mais efetiva em termos de mitigação, os países considerados ricos precisam reduzir sua produção e consumo absoluto intensivo em emissões e uso de recursos naturais, porque isso abriria espaço para a universalização para a produção e o consumo essencial para parcela da população mundial que vive em países em desenvolvimento e em situação de pobreza.
A sociedade quer realmente uma Economia de Baixo Carbono com justiça social?
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