Por Gabriel Domingos, Alana Morzelli e Alice Lima
Fotos: Agência Estadual de Notícias e Prefeitura de Curitiba
Supervisão: Maíra Gioia
Essa reportagem é uma parceria do Núcleo Curitiba do Observatório das Metrópoles com a Agência Escola UFPR para discutir a cidade nas eleições municipais de 2024
Repense a sua viagem. Calma! Não se trata de ignorar o carro que pode estar na sua garagem ou a um toque de distância com os serviços de aplicativo. Mas, pense – junto comigo e com a professora e pesquisadora do Núcleo Curitiba do Observatório das Metrópoles, Patrícia Schipitoski Monteiro! Se você está indo para a padaria do bairro (que fica a quem sabe três ou quatro quadras de distância) e já pegou as chaves do carro, será que o estacionamento do lugar não vai estar cheio? Ou quem sabe é um horário de pico e tem um trânsito mais pesado?
Tá certo que o “se” não entra em campo, mas parando para pensar, talvez tirar a ferrugem da bicicleta e pedalar por uns 15 minutinhos garantam um pão fresquinho mais rápido, com menos estresse e bem mais qualidade de vida. Um horário bom, com a canaleta de ônibus e uma estação-tubo ao lado, também oferecem, diz Patrícia, uma opção que pode ser mais rápida e mais confortável. Mas, ela garante, é preciso perder o medo de andar pela cidade.
“Ocupar a cidade tem a ver, também, com perder o medo de andar de ônibus ou na rua e quanto mais a gente reverter esse ciclo, melhor para todo mundo”, afirma.
É claro que ao atravessar a rua, entrar na estação-tubo e pagar R$ 6 reais pela viagem de ida e mais R$ 6 pela passagem de volta encarece o valor do seu cafézinho – mesmo que o seu ônibus esteja bem perto e tenha horários acessíveis. Assim, você fica desencorajado de deixar o carro na garagem. Por isso, Patrícia explica que o modelo atual de transporte público de Curitiba e Região Metropolitana precisa ser repensado. Segundo a pesquisadora, é essencial pensar em maneiras alternativas de financiar os custos da operação do transporte coletivo e isso passa, principalmente, pelo preço.
“Precisamos aumentar o investimento, mas isso não pode sair do bolso do usuário. Ele já tem um gasto adicional que é o tempo: o tempo gasto pelo usuário no transporte público é maior que no privado e isso não entra na conta”, diz a pesquisadora.
Atualmente, o custo do funcionamento do transporte coletivo é mantido pela equação de soma entre a tarifa técnica – paga pelo Poder Público – e a tarifa do usuário (leia abaixo).
Uma possibilidade tramita na Câmara dos Deputados; a PEC 25/2023. Proposta pela deputada Luiza Erundina (PSOL) e outros, a ideia é criar um valor adicional para o usuário do sistema de transporte privado sobre o uso viário. Novos impostos, porém, não podem ser a única solução, defende Patrícia. Por isso, outra possibilidade é uma inspiração europeia. Na França, parte do subsídio para o funcionamento do transporte público vem do financiamento das propostas de enfrentamento à emergência climática.
Essas são algumas ideias para ter uma passagem de ônibus mais acessível (ou, quem sabe, gratuita) para incentivar você a deixar o carro em casa na hora de buscar o cafezinho. Passagem mais barata também pode significar ajuda para quem mora nas periferias ou mesmo nas zonas afastadas da Região Metropolitana de Curitiba.
Pedirei permissão para construir outro exemplo hipotético:
- No momento em que eu escrevo essa reportagem são 15h e 05 minutos de uma segunda-feira. Exatamente nesse horário a linha A06 – Tamandaré/Guadalupe (via Rodovia dos Minérios) deixa o terminal de Almirante Tamandaré para percorrer pelo menos 37 minutos de viagem por 40 pontos até o destino final no Terminal Guadalupe. Caso você tenha tido algum imprevisto em sua rotina e perdeu o ônibus das 15h05, o próximo só estará disponível após um intervalo de 40 minutos, às 15h45. Esses intervalos variam entre 20 minutos e 1 hora até o último horário do dia, às 22h. O mesmo padrão segue no trajeto inverso – do Guadalupe para o Almirante Tamandaré.
Nosso objetivo, com esse exercício, é mostrar o tamanho de uma linha extensa da Região Metropolitana. Também em Curitiba temos um exemplo: a linha Inter 2 (anti-horário) cobre uma extensão de 31 km. Em sentido circular, ela começa a operação no terminal Cabral e roda a cidade toda para terminar a operação outra vez no Cabral.
No início, quando foi desenhado o planejamento urbano da cidade de Curitiba, explica o também pesquisador do Observatório das Metrópoles, Anderson Proença, essas linhas enormes não eram a prioridade do sistema de transporte. Anderson explica que a ideia era concentrar um maior número de pessoas nos chamados eixos estruturais (onde passa o ligeirão). Elas seriam atendidas por um maior número de serviços e o transporte conseguiria, com qualidade e velocidade, atender a um maior número de pessoas.
Acontece que os eixos, explica Anderson, tornaram-se regiões supervalorizadas e de altíssimo poder aquisitivo. Esse fenômeno impulsionou a saída de pessoas com menor acesso aos recursos econômicos para zonas periféricas da cidade. Por isso, o passageiro de Almirante Tamandaré depende da linha A06, com seus horários espaçados e custando R$ 6 reais (ou R$ 5,50 – por enquanto – se o pagamento for com o cartão metrocard) para chegar até o centro de Curitiba, no terminal Guadalupe. Também o passageiro do Inter 2 precisará estender sua viagem em muitos quilômetros para conseguir uma integração, uma vez que para trocar de linha gratuitamente, ele, quase sempre, necessita ir até o próximo terminal.
É provável que chegando às eleições, com a discussão do contrato ganhando força, os candidatos e candidatas, de qualquer lado político, reforcem a história e o “orgulho” pelo sistema de transporte de Curitiba. Anderson diz que, de fato, o sistema tem seus pontos positivos. Já Patrícia compartilha da mesma opinião, mas diz:
“Um argumento não invalida o outro, nosso sistema tem problemas e precisamos resolvê-los”, afirma.
Uma proposta para corrigir as deficiências atuais do transporte coletivo é a elaboração e aplicação do Sistema Único de Mobilidade nos moldes do que é o Sistema Único de Saúde (SUS). Patrícia explica que essa é uma tentativa de formular um sistema que tenha uma boa articulação entre as esferas municipais, estaduais e nacionais de poder. Dessa forma, assim como é com o SUS, a ideia é que o Governo Federal organize e aplique políticas universais do funcionamento do transporte, ou seja, quais valores tem de ser aplicados e atendidos por todos. À medida, porém, em que descem os níveis de poder para estados e municípios, cada ente fica responsável pela adaptação e aplicação de necessidades específicas, por exemplo: estratégias de operação do transporte.
Modelos e soluções alternativas, como o transporte sobre trilhos, são a segunda possibilidade de melhorias para o atual sistema do transporte coletivo. Segundo Anderson, a ideia não é substituir um modelo pelo outro, nem ficar comparando qual deles é o melhor. Eles podem, segundo o pesquisador, ser complementares. Anderson também defende que uma infraestrutura boa para bicicletas é uma opção para alimentar o sistema de transporte coletivo. Elas podem cumprir uma função de você andar com mais rapidez até os terminais de ônibus. Para isso, segundo ele, é necessário entender a bicicleta como parte desse sistema, não apenas como lazer, mas como opção funcional e garantir uma infraestrutura de ciclovias e, também, de segurança.
Saiba como é calculado o valor da tarifa
Para entender o valor que pagamos pela passagem de ônibus em Curitiba, primeiro precisamos entender o valor que a prefeitura paga, que é chamada de tarifa técnica. Com base nas informações divulgadas pela Urbanização de Curitiba (Urbs), válidas até março de 2024, vamos te explicar quais são os valores usados para calcular essa tarifa e como é calculada a tarifa social – que é o valor final pago pelos usuários do transporte público.
Diferença entre tarifa social e tarifa técnica
A tarifa técnica nada mais é do que o custo médio real para manter o sistema de transporte, dividido pelo número de passageiros pagantes. Enquanto a tarifa social é o valor pago nas catracas, que considera o valor da tarifa técnica e subtrai o subsídio da prefeitura desse valor, que é parte das passagens que o poder público municipal paga para diminuir o preço das passagens. É a prefeitura quem define e anuncia qual será o valor destinado para o transporte.
Como é calculada a tarifa técnica?
Para calcular a tarifa técnica são usados dois elementos: o IPK – que divide a média de passageiros pagantes pela estimativa média de quilômetros rodados e os índices de custos por quilômetro – que incluem preço do óleo diesel, correção do preço dos pneus e preço dos veículos. Por serem valores que mudam constantemente, os contratos de concessão do serviço de transporte público da capital estabelecem que anualmente seja feita uma atualização da tarifa técnica.
Assim, o cálculo da tarifa técnica segue essa equação:
Quanto custa o quilômetro?
Atualmente, o custo do quilômetro rodado na capital é de aproximadamente R$ 12,50. Esse valor é calculado a partir da soma do custo do combustível e lubrificante, peças e acessórios dos veículos, rodagem, custo de pagamento de funcionários e benefícios, encargos sociais e contribuição previdenciária, custos de administração, amortização, rentabilidade justa e impostos e taxas aplicados.
E nas regiões metropolitanas?
Já na região metropolitana, o cálculo da tarifa depende dos subsídios pagos por cada prefeitura da região. Vale lembrar que quanto maior o subsídio, menor é o valor da passagem para o usuário.
Veja, no gráfico abaixo, a participação de cada item no cálculo dos custos:
Eleições 2024
Contribuindo para o processo democrático, a Agência Escola e o Observatório das Metrópoles firmaram parceria para discutir a cidade nas eleições municipais de 2024. Acompanhe, nas próximas próximas semanas, mais reportagens com temas de interesse da população e que auxiliam na escolha do voto.