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Projeto Território Caiçara: harmonizando direitos nas comunidades tradicionais das ilhas das Peças e do Superagui é finalizado com relatório produzido pelo Lageamb

Realizado em quatro anos, diagnóstico social e cartográfico de 18 comunidades tradicionais auxilia na construção de políticas públicas

 

Por Priscila Murr

Fotos: Lageamb 

Parceria AE UFPR e Lageamb 

 

Durante quatro anos, o estabelecimento de um vínculo: cientistas do Laboratório de Geoprocessamento e Estudos Ambientais (Lageamb) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) percorrem as Unidades de Conservação (UCs) na região da Ilha das Peças, Ilha do Superagui e Baía dos Pinheiros em um processo de escuta. Em quase 300 dias de campo, foram cerca de 650 entrevistas feitas com as famílias locais e mais de 120 reuniões realizadas junto às comunidades e instituições envolvidas, dando vida ao Projeto Território Caiçara: harmonizando direitos nas comunidades tradicionais das ilhas das Peças e do Superagui.

Mais do que uma ação orientada pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ou no âmbito da Petrobras, a realização desse projeto representa uma verdadeira imersão no contexto das 18 comunidades tradicionais na região do Parque Nacional do Superagui (PNS). A partir do conhecimento sobre a situação de cada uma delas, seus conflitos e expectativas, a ação fortalece o princípio de dupla proteção através da harmonização dos direitos ambientais, sociais e territoriais.

 

O retrato do dia a dia nas comunidades caiçaras / Foto: Lucas Pontes e Manuelle Lago

Executado entre janeiro de 2021 e dezembro de 2024, esse diagnóstico social e cartográfico tem seus trabalhos formalmente finalizados e registrados por meio do Relatório 4B, elaborado pelo Lageamb. Segundo a geógrafa especialista em Análise Ambiental e bolsista do laboratório, Vivian Cordeiro da Silva, que participou ativamente da construção do documento final, “os resultados foram satisfatórios, pois elaboramos este diagnóstico a partir de um processo participativo, com muita escuta e diálogo, construindo pontes entre as comunidades, os órgãos públicos e a academia”. “Assim, eu acredito que o resultado mais imediato que se pode verificar é que instituições como ICMBio e SPU direcionaram os seus olhares para as comunidades tradicionais, e passaram a escutá-las como sujeitos que devem participar dos processos decisórios que afetam suas realidades, respeitando seu tempo e seus modos de vida”, destaca.

A iniciativa oportuniza o conhecimento e reconhecimento da população, permitindo que os órgãos responsáveis pelas políticas fundiárias estabeleçam ferramentas mais condizentes com a realidade e com as demandas de povos que tiveram seus territórios sobrepostos por unidades de conservação (UCs). Além disso, tal trabalho fornece informações cruciais para o planejamento de outras políticas públicas e para a tomada de decisão nos processos que afetam as comunidades locais, a partir da noção de “harmonização de direitos”, que diz respeito ao reconhecimento legal e à conciliação dos benefícios da natureza e dos povos de permanecerem em seus territórios com dignidade e segurança.

 

Imagens de sobrevoo de drone na área contemplada pelo Projeto / Foto: Lucas Pontes

 

O trabalho desenvolvido pela UFPR, por meio do Lageamb, além de efetivar uma aproximação junto às comunidades tradicionais, cumpre com uma condicionante ambiental. Então, “a motivação é uma exigência, um requisito legal que a Petrobras tem que cumprir perante o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), no processo de licenciamento do Pré-Sal Etapa 3”, conta o fiscal do contrato que acompanhou o projeto e que atua na Gestão Ambiental para o E&P (Exploração e Produção) da Petrobras, Thiago Dias Rodrigues. “Esse tipo de projeto é importante para nos aproximar dessas comunidades e poder mostrar um pouco do nosso trabalho. E a gente aproveita para fazer um primeiro contato, já que existem outros programas que são executados, como o monitoramento de praias. Então, além da aproximação junto a esse público, também tem essa interface”, destaca Rodrigues.

O analista ambiental do ICMBio, que faz parte do Núcleo de Gestão Integrada Antonina-Guaraqueçaba, Luiz Henrique Condrati, reitera a importância primordial do projeto no sentido de diagnóstico para fins de regularização da área, e também destaca a importância paralela de se criar espaços de diálogo, de interação. “Esse trabalho colheu dados de diagnóstico atual da área e levantou informações sobre o contexto socioeconômico das famílias, estabelecendo pontes que favorecem o diálogo. Tudo isso vai ser utilizado tanto para a regulação fundiária quanto para outras ações e atividades de gestão. E foi graças às inúmeras reuniões e conversas, houve uma reaproximação da gestão do PNS e das comunidades tradicionais, para que conflitos históricos possam ser dirimidos e se volte a boa relação, trazendo novamente as agendas positivas, tanto para as comunidades tradicionais quanto para a gestão da unidade de conservação”.

 

Um resultado partilhado

 

As comunidades abarcadas no projeto estão numa zona de impacto direto da exploração do Pré-Sal. Além disso, a partir da importância principal de tentar regularizar o território onde vivem essas populações tradicionais, o desenvolvimento de uma ação como essa estabelece a relação da população com o espaço e demonstra, aos órgãos competentes, a importância da permanência e manutenção daquele povo no local. Morador da região da comunidade de Vila Rita e um dos coordenadores do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais do Litoral do Paraná (MOPEAR), Silvano Vidal Cordeiro aponta que o trabalho dos profissionais do Lageamb é importante em prol do bem comum, na medida em que contempla o povo que mora ali. “A maior importância desse projeto, para nós, é a regularização do território. Porque, quando os órgãos ambientais ou o governo vão fazer reuniões, não aparecem as comunidades tradicionais, eles esquecem de apontar a comunidade de seres humanos dali. Esse projeto foi elaborado em volta do Parque Nacional, abrange Superagui, Ilha das Peças e várias outras comunidades que estão ao redor do parque. E, apesar de ainda ser um estudo, nós esperamos que isso possa contribuir para gerar um documento. A gente entende que é excelente cuidar do meio ambiente, mas o mais importante é cuidar do ser humano que está ali. Para nós, essa regularização é o sonho de quem vive lá!”, explica.

Cumprindo com a expectativa teórica, o projeto fica registrado num relatório público; os resultados já estão sendo trabalhados para que se possa aplicá-los em defesa das comunidades. A versão final do documento, que pode ser acessada neste link, reúne as informações coletadas, e foi entregue às lideranças e escolas das 18 comunidades tradicionais abrangidas pelo projeto, bem como para representantes do ICMBio, SPU, IAT, Petrobras, UFPR e Prefeitura de Guaraqueçaba em novembro de 2024. Sua divulgação também acontece por meio deste vídeo, que demonstra os principais números e conclusões do relatório. Além disso, uma Audiência Pública acontece no plenarinho da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), em cinco (5) de junho, para apresentar o documento.

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