Por Priscila Murr
Fotos: Agência Escola UFPR
Supervisão: Maíra Gioia
Para combater a desinformação, ferramentas como a educação midiática promovem a inclusão do público com 60 anos ou mais
Desinformação, cultura digital, fake news. Você já deve ter ouvido falar em pelo menos um desses termos. Eles carregam significados comuns ao universo digital, e surgem a partir da evolução tecnológica. Nesse ambiente de novidade constante, é necessário atenção: aqueles que não estão diretamente imersos no ambiente virtual podem ter dificuldades, sofrendo com a falta de preparo em relação aos procedimentos básicos para interação on-line.
Isso se torna uma questão fundamental quando determinados grupos sociais passam a estar excluídos do fluxo natural de aprendizados. Com o surgimento da internet, por exemplo, a alfabetização midiática e informacional passa a ser uma preocupação nas escolas, mas, no que diz respeito aos idosos, essa realidade não dá conta de uma estratégia de educação midiática.
A partir dessa ideia, considerando que cerca de 32 milhões de brasileiros têm 60 anos ou mais, representando, segundo dados do último Censo divulgados Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 15% da população total do país, a preocupação com a qualificação da pessoa idosa fica evidente tanto no dia a dia quanto nas pesquisas acadêmico-científicas.
Mediante isso, o jornalista Cléber Gonçalves, que recém defendeu sua tese de doutorado, em setembro de 2024, pelo Programa de Pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), propôs estudar justamente esse tema. Seu trabalho, intitulado “Educação Midiática para pessoas idosas com foco na desinformação: trilhas orientativas para iniciativas no contexto da cultura digital”, operacionaliza modos inclusão por meio da instrução desse grupo em específico. Cléber foi orientado pela professora Myrian Regina Del Vecchio de Lima, que, em conjunto com o professor José Carlos Fernandes, lidera o Click (Grupo de Pesquisa Comunicação e Cultura Ciber).
Para compreender as condutas e necessidades de formação com relação ao desenvolvimento de competências digitais da pessoa idosa, a investigação do jornalista foi construída com base no protocolo “CAAC” (Compreensão, Aproximação, Aplicação e Compartilhamento), criado por ele próprio para observação do fenômeno da desinformação na Cultura Digital a partir da vertente dos Estudos Culturais.
Segundo o autor, além de explorar e discutir pílulas do conhecimento relacionadas ao tema central, tais como cultura, cultura digital, Fake News e condição da população idosa no Brasil, a Tese problematiza as orientações que podem ser definidas como fundamentos para a concepção de programas e projetos educativo-midiáticos voltados à população idosa.
Ele assume, ainda, que “as constantes e intensas novidades do digital contribuem para o descompasso entre as práticas sociais de consumo de notícias por parte das pessoas idosas e as habilidades requeridas e reformuladas constantemente”. Segundo o estudioso, ações de educação midiática voltadas a este público podem contribuir para o domínio das competências esperadas.
Observando os adventos do envelhecimento populacional, é necessária a criação de dispositivos legais voltados à orientação e proteção contra os impactos da desinformação. Afinal, com a queda na taxa de fecundidade e o aumento da expectativa de vida, o IBGE projeta que, em 2046, a população idosa seja a faixa etária mais representativa do país (28%).
A UFPR promove ações favoráveis à inclusão digital de pessoas idosas, junto ao Departamento de Terapia Ocupacional, por meio do projeto de extensão “ID60+”. A iniciativa busca orientar quanto à utilização independente de Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDICs).
Com foco aos conhecimentos e habilidades relacionados em especial à utilização dos Smartphones, a proposta é desmistificar a relação de dificuldades entre pessoas com idade igual ou superior a 60 anos e as tecnologias emergentes. A ideia é tornar mais “fácil e emocionante” o contato com o universo on-line.
Uma das estudantes de Terapia Ocupacional (TO) da UFPR, que atua no ID60+, Carolina Guarezi Senem, fala sobre a importância da iniciativa no sentido de adaptação da pessoa idosa com relação ao digital. “Projetos de inclusão digital como o ID60+ são essenciais para diminuir a lacuna entre os idosos e a modernidade, visto que muitos deles tiveram pouco ou nenhum contato com tecnologias ao longo de suas vidas”, garante.
Carolina conta, ainda, que a possibilidade de autonomia através do letramento digital gera maior qualidade de vida para esse grupo de pessoas. “Alguns participantes [do ID60+] relatam que pedem auxílio para filhos ou netos, mas acabam desistindo, pois estes demonstram desinteresse em ajudá-los ou não têm paciência”.
Logo, por meio de demandas relacionadas a aplicativos de comunicação, redes sociais, transporte e navegação on-line, bem como configurações de dispositivos para aumentar a segurança, esses participantes se tornam mais confiantes e independentes.
A iniciativa da área de TO vai justamente ao encontro do objetivo geral da mencionada tese, que traz uma proposta de orientações para educação midiática com foco especial no aspecto da desinformação na internet, considerando o contexto da cultura digital como imperativo à inserção social.
O autor do trabalho aponta que as atividades cotidianas dependem cada vez mais dos recursos digitais e, “ao mesmo tempo, a população de pessoas idosas acaba sendo deixada de lado nessa temática, por várias razões, entre elas, o preconceito relacionado à idade. Então, pensar em estratégias voltadas a esse público significa se preocupar em incluir a todos nesse contexto tecnológico, de forma que seja cada vez mais justo, democrático e participativo”.
ID60+
Sob orientação da professora Taiuani Marquine Raymundo, do Departamento de TO da UFPR, o Projeto ID60+ acontece semestralmente, no prédio de Terapia Ocupacional, no campus Jardim Botânico. Composto por 12 encontros no modelo de Oficina, proporciona, além do letramento digital, a participação social, ampliando o convívio, o bem-estar e, consequentemente, a saúde da população idosa participante.