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Expedição Antártida: saiba como é fazer ciência onde o sol não se põe

Por Alice Lima 

Supervisão: Maíra Gioia

Fotos: Anderson Astor, Marcelo Curia/ICCE e arquivo pessoal

 

Pesquisadores que estudam a relação entre a variação de gelo marinho e ciclones já fizeram o lançamento de 13 radiossondas e os próximos locais de disparos serão essenciais para a pesquisa

 

Uma imensidão de gelo, icebergs gigantes e um sol que não se põe. Essa tem sido a visão da cientista Camila Carpenedo, a professora e doutora em Ciências da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que embarcou na expedição inédita para a Antártida no dia 22 de novembro. A pesquisadora do Novo Arranjo de Pesquisa e Inovação de Emergência Climática, coordenadora do Núcleo de Estudos sobre Variabilidade e Mudanças Climáticas (Nuvem), e coordenadora do projeto Polar Connections do Programa Antártico Brasileiro (Proantar), está a bordo do navio quebra gelo russo, o Akademik Tryoshnikov, para analisar a influência do gelo marinho nos ciclones extratropicais que atingem o continente da América do Sul. Na segunda reportagem da série sobre a expedição, ela conta sobre o andamento da pesquisa e o dia a dia da expedição que está dando a volta no continente mais inóspito do planeta Terra.

 

Lançamento Radiossondas

O navio que partiu do Rio Grande do Sul, no dia 22 de novembro, chegou à primeira estação da Antártida apenas no dia 4 de dezembro. Antes disso, no dia 30/11 no norte do mar de Weddell, numa condição pré-frontal (antes da passagem de uma frente fria), foi lançada a primeiro radiossonda.
“Foi o evento do navio! Estávamos muito apreensivos para que desse tudo certo, mas deu!”, conta Camila Carpenedo, responsável pela pesquisa com as radiossondas.
Os equipamentos lançados são sensores acoplados em balões meteorológicos para medição de dados sobre a temperatura do ar, umidade, velocidade do vento e pressão atmosférica. Essas informações analisam o comportamento da atmosfera e são utilizadas pela equipe para identificar a relação entre o gelo marinho e a passagem de frentes frias, que dão origem aos ciclones extratropicais: fenômenos climáticos extremos associados a chuvas intensas, ventos intensos, granizo e eventos de ressaca do mar.
Até o momento da publicação desta reportagem, Camila e Cláudia Parise, pesquisadora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), realizaram o lançamento de 13 radiossondas sob diversos perfis atmosféricos para melhor compreensão do comportamento das frentes frias. A equipe já coletou dados em mar aberto, nas estações de pesquisa, em condições de gelo marinho e durante a passagem dos ciclones extratropicais.
Ao centro da foto, Camila faz o lançamento de uma radiossonda. Créditos: Anderson Astor e Marcelo Curia/ICCE

O processo de lançamento envolve a preparação das cientistas, que precisam estar com as roupas adequadas para o clima e a configuração do sistema que recebe os dados da radiossonda. As radiossondas são conectadas a um balão atmosférico inflado com gás hélio, que sobe uma altura de aproximadamente 30 km. Após atingir certa altura, o balão explode e a radiossonda cai no mar, assim, a equipe depende de um equipamento específico para extrair os dados coletados pelos sensores.

 

Primeiras análises

 

Apesar dos resultados oficiais ainda terem um longo caminho pela frente, já é possível identificar algumas características das frente frias. Carpenedo relata que entre os dias 8 e 10 de dezembro, foi feito o lançamento de uma radiossonda relacionada a uma frente fria no mar de Weddell, em um local em que a água do mar estava congelada. Nesse caso, ela explica que a frente fria analisada estava associada a um “rio voador”, um corredor de transporte de umidade da Amazônia em direção ao pólo. Os rios voadores estão associados à ocorrência de ciclones extratropicais e favorecem a incidência de ondas de calor na Antártida.

 

 

“O transporte de ar úmido e quente da região tropical favorece o derretimento do gelo marinho e do gelo continental”, explica.

 

 

Ela também conta que a partir a latitude 50°S no Atlântico Sul, é possível ver algumas consequências das variações climáticas, como icebergs que se soltaram de geleiras devido ao derretimento e trechos de gelo marinho atipicamente maiores.

 

 

“Começamos a ver muitos icebergs grandes, os quais muito provavelmente se desprenderam das plataformas de gelo da Antártica e se deslocaram mais de 2 mil quilômetros. Novembro de 2024 também foi o recorde histórico de menor extensão do gelo marinho antártico. Apesar disso, o navio navegou sobre uma região onde o gelo marinho estava anormalmente maior, no noroeste do mar de Weddell (ao sul do Atlântico Sul)”, conta.

 

 

Dia a dia

A rotina no navio é simples, os 53 pesquisadores a bordo recebem quatro refeições por dia (às 7h30, 11h30, 15h30 e 19h30), trabalham nas pesquisas de cada campo de estudo e descansam para iniciar as atividades novamente no dia seguinte. Ao todo, são 120 pessoas na embarcação, acomodadas em 75 cabines. Em reportagem publicada pelo Jornal da Universidade, Luiz Fernando Magalhães, integrante do grupo de pesquisa em Glaciologia do Centro Polar e Climático, explica que o navio é equipado com laboratórios que possibilitam a produção de pesquisa em tempo real. No total, são 10 laboratórios fixos, divididos entre laboratórios de via seca, utilizados para armazenar instrumentos e equipamentos eletrônicos, e laboratórios de via úmida, usados para analisar amostras de gelo e mar. Além das áreas técnicas, há espaços de lavanderia, enfermaria, restaurante e salas de reunião.
Em um relato mais pessoal, Camila conta que a rotina do navio está mais tranquila do que o esperado, inclusive toda a logística envolvendo alimentação, cabines e banheiro.
“Aqui é o parque de diversão dos cientistas! Muito incrível! […] Claro que sinto falta de alguns alimentos, mas isso também acontece quando viajo para fora do Brasil”, diz.
Apesar da rotina tranquila, ela afirma que a parte mais difícil da adaptação é o fuso horário em constante mudança. Como a rota do navio envolve dar a volta no continente que contorna o polo Sul, a tripulação tecnicamente passará por todos os fusos horários do mundo. No momento, eles estão 7h adiantados em relação ao Brasil, em UTM+4. Somado à diferença de horários, durante o trimestre de verão no círculo polar antártico, o sol nunca se põe, ou seja, durante 24 horas existe luz solar.
“Às 11 da noite o Sol está acima do horizonte. Isso acaba confundindo o nosso relógio biológico”, conta.
Foto do gelo marinho tirada às 23 horas da noite, o sol não se põe devido ao fenômeno de verão no círculo polar antártico. Foto: arquivo pessoal

Próximos passos

 

A equipe de meteorologia ainda fará o lançamento de 30 radiossondas até o final da expedição, além do mapeamento do gelo marinho via drone. Os próximos setores a serem analisados, como o mar de Ross, Bellingshausen e Amundsen, estão dentre os mais importantes em termos de relação com o clima da América do Sul e, portanto, essenciais para a pesquisa.

Até o momento da última conversa com Camila, o navio estava nas coordenadas 67°S e 67°E.

 

Última localização do navio marcada pelo ícone vermelho. Mapa disponibilizado pelo Google Earth

Quer saber mais?

 

A Agência Escola UFPR estará em contato direto com a cientista durante toda a expedição. Na próxima reportagem da nossa série, você vai saber detalhes do retorno ao Brasil, curiosidades e possíveis resultados já catalogados da pesquisa.

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Sobre a Agência Escola UFPR

A Agência Escola UFPR, a AE, é um projeto criado pelo Setor de Artes, Comunicação e Design (SACOD) para conectar ciência e sociedade. Desde 2018, possui uma equipe multidisciplinar de diversas áreas, cursos e programas que colocam em prática a divulgação científica. Para apresentar aos nossos públicos as pesquisas da UFPR, produzimos conteúdos em vários formatos, como matérias, reportagens, podcasts, audiovisuais, eventos e muito mais.

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